0.1. Senão na abstração esquizopathológica do audível subtraído do audível.
0.11. O silêncio é uma promessa linguística vazia.
1. Tudo soa.
1.1. Tudo que existe tem algum tipo de reflexo no corpo sonoro.
1.2. O som é anterior a toda experiência – de que algo é assim.
1.21. Ele é anterior ao como, mas não é anterior ao quê.
1.3. Ao som, ouvimos apenas.
1.31. Em termos simplificados: o som é número.
2. O audível é tudo que soa num determinado tempespaço.
2.1. O audível é a totalidade das músicas, não dos sons.
2.11. O audível é determinado pelas músicas, e por serem todas as músicas.
2.111. O audível se assemelha a um ouvir-aí (klangfabermelodiedasein).
2.2. O audível problematiza-se em músicas.
2.21. Pois a totalidade das músicas determina o que é o ruído e também o que silencia.
2.22. Tudo que silencia faz soar outro som no audível.
2.3. O audível é a existência de modulações, movimentos sonoros no tempespaço.
2.31. É essencial para o som poder ser parte constituinte de uma música.
2.32. Modulações são ligações entre sons.
2.33. O som em si, puro, é uma utopia imaginativa, limite inalcançável do atomismo sonoro, mas os movimentos sonoros são fatos.
2.331. Pareceria como que um acaso se ao som que pudesse existir por si próprio, só, e se ajustasse depois a uma situação de silêncio ou ruído.
2.332. Se os sons podem aparecer numa música, isto já deve estar neles.
2.333. Não podemos ouvir nenhum som fora da possibilidade de sua ligação modular com outros.
2.334. Só podemos ouvir-no-mundo.
2.4. O som é auto-suficiente, na medida em que pode aparecer em todas as situações possíveis, mas esta forma de auto-suficiência é uma forma de vínculo modular na música, uma forma de não ser auto-suficiente.
2.41. Se conheço o som, conheço também todas as possibilidades de modulação sua em músicas (arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e espacialização).
2.42. A possibilidade de seu aparecimento em músicas são suas modulações.
2.5. Dados todos os sons estão dadas também todas as músicas possíveis.
2.6. O som é seu objeto e nome.
2.61. O som é simples.
2.62. O som é o elementar(stoichéia) da audição.
2.621. O som é expoente da música.
2.63. Todo som pode ser decomposto em sons constituintes desses complexos através de suas modulações(arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e espacialização).
2.64. Os sons todos constituem o ruído, não o audível. Por isto não podem ser compostos.
2.65. O som é seu significado.
3. O ruído só pode determinar uma forma física, e não as propriedades metafísicas passionais(pathós) do audível. Pois estas são produzidas apenas pelas músicas – são constituídas apenas pelas composições modulares dos sons.
3.1. Os sons não têm sentimentos como os números não têm cor.
3.2. Um som difere de outro – desconsideradas suas propriedades modulares – apenas por serem diferentes.
3.3. O conceito de som nada é senão o que todos os sons têm em comum, a forma geral do som.
3.31. Forma esta indizível.
3.4. O ruído subsiste independentemente de qual seja o audível.
3.5. Espaço e duração são os meios onde os sons pendem juntos através das modulações.
3.6. Só havendo sons pode haver uma forma fixa do audível.
3.61. O fixo, o ruído e o som são um só e o mesmo elementar do seu ouvintecompositor..
4. A composição modular dos sons constitui a música.
4.1. Na música os sons se concatenam, como os elos de uma corrente.
4.11. Como as moléculas d’água rio abaixo.
4.12. Como os rios mundo afora.
4.121. Nenhuma metáfora poderia descrever o que tenho do audível.
4.2. Na música os sons estão uns para os outros de uma determinada modulação.
4.21. A maneira como os sons se vinculam na música é a estrutura musical.
4.22. O estilo é a possibilidade de fixação dessas estruturas modulares(arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e espacialização).
4.23. A totalidade das músicas existentes é o audível.
4.24. O que difere o audível do ruído é a existência de uma lógica passional(pathológica) na audiçãocomposição das modulações sonoras.
4.3. A totalidade das músicas determina também o que silencia.
4.31. As músicas são independentes umas das outras.
4.32. Da existência ou inexistência de uma música não se pode concluir a existência ou inexistência de outra.
4.33. Mas esta independência é também uma forma de vínculo entre o ruído e a música em questão.
4.4. Sentimos os sons e damos sentido às músicas.
4.5. A experiência musical é sinestésica.
4.51. As modulações de som geram modulações de sentimentos e memórias sinestésicas.
4.6. Compomosouvimos músicas.
4.61. A música é a lógica passional dos entressons.
4.611. A audiçãocomposição musical produz situações através da existência e inexistências de certas modulações sonoras.
4.612. A audiçãocomposição musical é mais que um modelo das paixões.
4.6121. Aos sons correspondem, na composição sentimentos, paixões.
4.6122. Sentir é compor. Ouvir é portanto, compor.
4.61221. A audiçãocomposição é influenciada por todas as experiências do ouvintecompositor.
4.61222. Eu não escuto a qualquer música d’outrem, mas só à minha.
4.61223. A música composta nunca é a mesma ouvida.
4.613. Que os sons estejam uns para os outros em determinadas melodias, harmonias, ritmos, cores timbrísticas e espaços produz sentimentos assim uns para os outros.
4.62. A música é uma modulação do que sentimos.
4.621. A música é a esquizofrenia entre o som e o audível, límites mínimo e máximo do fenômeno.
4.7. A música é proposiçãofato.
4.71. É assim que a audiçãocomposição se enlaça com a paixão; ela vai até ela.
4.72. Ela é como uma régua(métron) aposta às paixões.
4.721. Apenas os pontos mais externos da régua tocam a paixão a ser medida.
4.73. A música é a perpétua relação criadora de modulações entre os sons que nos trespassam.
4.731. Tal relação criadora consiste nas coordenações lógicas entre os sentimentos e os sons.
4.732. A música produz a sua própria medida, suas próprias regras e réguas.
4.74. Só quem sente algo, compõe.
4.75. Só quem habita o que sente põe com o lógos.
4.751. A música, para ser composta deve ter algo em comum com algum pathós.
4.752. A composição pode compor toda afecçãosentimento cuja forma ela tenha. A composição melancólica, tudo que for melancolia; a composição caótica, tudo que for caos, etc.
4.8. Uma música não é uma imagem, embora uma imagem possa corresponder a ela.
5. O estilo é consequência da composição, não o contrário.
5.1. O estilo, o modo de composição, é a possibilidade de que os sons estejam uns para os outros tal como os sentimentos do ouvintecompositor o estão.
5.11. Não pode haver hierarquia dos estilos. Só podemos anteouvir o que nós mesmo compomos.
5.12. Como exemplo disto podemos imaginar o mito histórico da descoberta da perspectiva pictórica e o impacto que isto teve nas modulações intensivas e timbrísticas entre a música medieval e a renascentista européia ocidental.
5.2. A audiçãocomposição produz sua paixão de fora, e seu ponto de vista é seu estilo.
5.21. A audiçãocomposição pode ou não concordar com a realidade do ouvintecompositor.
5.211. Desta diferença de estilos nascem as influências e querelas musicais.
5.212. Não simpatizar com uma música é não simpatizar com as paixõesrazões que acreditamos que seu compositor tenha.
5.3. A audiçãocomposição não pode colocar-se fora da paixãorazão de seu ouvintecompositor.
5.4. O que toda composição, seja qual for seu estilo, deve ter em comum com algo para poder de algum modo produzí-lo é seu esquizo pathológico, os filtros das razõespaixões do mundo do ouvintecompositor.
5.41. Estes filtros esquizo pathológico unem os sentimentosidéias aos sons através da criação contínua de relações sinestésicas entre as experiências memoriais e sensitivas.
5.5. O som não é estilizado.
5.51. Porém, toda lógica está submetida a uma estética.
5.52. Toda composição é uma composição lógica.
5.521. Lógica das paixões.
5.53. A composição musica uma situação possível no tempespaço lógico.
5.531. A composição contém a possibilidade da situação que ela produz.
5.532. A composição produz o que produz por meio do estilo.
5.6. O que a composição produz é seu sentido.
5.7. Tentar explicar uma música é tentar explicar o mundo através daquela música.
5.71. Somos como soamos.
5.72. A música é a ontologia do ouvintecompositor.
5.73. A música é o esquizo coxeando entre paixões e razões: ruídos e silêncios imaginários.
6. O estilo são as regras dos jogos esquizo passionais lógicos.
6.1. A lógica passional de uma composição são suas modulações de sons. Que arbitrariamente expresso pelos conceitos de movimentação de melodia, intensidade, harmonia, pulso, cor timbrística e espacialização.
6.2. “Ouvir às musas” como o próprio termo musicae propõe remete que ouvir é por com (ouvire aude).
6.21. A totalidade das modulações é a composição.
6.211. A totalidade das composições é o audível.
6.22. Não podemos compor nada de ilógico, pois o pensamento é lógico e a composição parte dele para produzir os sentimentos.
6.3. Na modulação, o sentimento exprime-se sensível e perceptivelmente ao ouvintecompositor.
6.31. Utilizamos os sons para ouvir o que se põe entre eles, as modulações.
6.32. À modulação pertence tudo o que for projeção passional, mas não o pathós. Portanto, a possibilidade do sentimento, não o próprio sentir. Na modulação está contida a forma de seu sentido mas não o conteúdo.
6.33. A modulação consiste que seus elementos, os sons, estão uns para os outros de uma determinada maneira. Toda modulação é uma música.
6.331. A modulação não é uma mistura de sons.(Como a proposição não é uma mistura de palavras.) A modulação é articulada e contínua.
6.4. Só músicas podem exprimir um sentido, uma classe de sons não.
6.41. Fica muito clara a essência da modulação quando a concebemos composta não de melodias, harmonias, ritmos, timbres, deslocamentos espaciais ou quaisquer outras variáveis modulares arbitrárias, dimensões dos sons, mas sim de pathólogós.
6.42. Duas formas de modulações se mostram possíveis: as elementares, compostas de sons e as moleculares, formadas de outras modulações.
6.421. A composição molecular está em relação dinâmica com a composição que trata das partes constituintes desse complexo.
6.422. Todo elementar é uma ilusão necessária para se evitar o abismo racional da impossível essência na linguagem.
6.5. A modulação substitui, na composição, a sons.
6.51. Os sons podem apenas ser nomeados, não descritos. Modulações podem ser descritas, não nomeadas.(Modulações são como flechas ao passo que sons são como pontos).
6.6. Há uma e apenas uma análise completa da modulação: a própria modulação.
6.61. Toda composição musical é inominável.
6.62. Nomear uma música a reduz a uma imagem poética.
6.63. Só a música faz um sentido; e só no contexto modular que os sons tem significado.
7. No caso-limite, as variáveis modulares diversas(arbitrariamente pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística, movimentação espacial, etc.) são uma e a mesma modulação do som.
7.1. Toda modulação pode ser decomposta em várias modulações constituintes desse complexo em seus conceitos arbitrários, tais como pulsos, harmonias, melodias, intensidades, cores timbrísticas e movimentações espaciais.
7.11. Quais seriam todas as modulações elementares?
7.111. A modulação elementar consiste em sons. Como não podemos, porém, fixar o número de sons diferentes, tampouco podemos especificar a composição de modulações elementares.
7.112. Mesmo pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e localização espacial são apenas rastros arbitrários do movimento sonoro.
7.113. Em última instância, as modulações elementares(stoichéia) são também limites abstratos inalcançáveis necessários para uma linguagem musical.
7.12. As variáveis modulares podem ou não se influenciarem mutuamente.
7.2. Se fixamos em variável uma parte constituinte da modulação, há uma classe de variáveis modulares que são todos os valores da modulação variável assim originada, como nos casos dos movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e espacialização.
7.21. Essas variáveis dependem ainda do que nós, segundo convenção sentimental arbitrária, queremos significar(meinen) com suas partes.
7.22. Se transformamos em variáveis, porém, todos os sinais cujo significado foi arbitrariamente determinado, ainda assim continua a haver uma tal classe(movimentos de pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística, espacialização).
7.221. Esta classe de fixações teóricas, porém, não depende mais de qualquer convenção, mas apenas da natureza da modulação. Ela corresponde a uma forma lógica subjetiva – a um protótipo lógico da composição.
7.23. Os valores que a variável modular pode assumir são fixados. A fixação de valores é a variável.
7.24. A fixação dos valores da variável modular é a especificação das modulações cuja marca comum é a variável.
7.241. A fixação é uma descrição da modulação.
7.242. A fixação tratará, pois, apenas de temas, não do significado deles.
7.243. E apenas isso é essencial para a fixação temática, que ela seja uma descrição dos temas fixos das modulações na música e nada enuncie sobre o estilo.
7.3. O tema é o sentimento que se intenta presentear numa ou mais variáveis modulares.
7.31. O tema é a imagem modularsonora.
7.32. Duas variáveis modulares diferentes podem ter, portanto, o mesmo tema em comum – designando nesse caso, sentimentos diferentes.
7.321. A marca comum de duas modulações nunca pode ser denunciada por serem compostas com o mesmo tema, mas através de diferentes modos de composição.
7.322. Pois o tema é, sem dúvida, arbitrário.
7.3221. Poderíamos, portanto, escolher também dois temas diferentes e, nesse caso, o que restaria de comum nas modulações?
7.33. Na composição corrente, acontece com muita frequência que um mesmo tema componha de maneiras diferentes – pertença, pois, a modulações diferentes – ou que dois temas diversos sejam empregados, na modulação, superficialmente do mesmo modo.
7.331. O mesmo tema repetido, não é a mesma modulação.
7.4. Para reconhecer a modulação na música, deve-se atentar para o uso significativo na composição.
7.41. É só no seu emprego lógico-sentimental, que a música determina um estilo.
7.42. Se uma tema não tem serventia na sintaxe musical, não tem sentimento e ou sentido.
7.421. Na esquizopathológica de composição, o sentimento de uma música nunca pode desempenhar papel algum; ele deve poder estabelecer-se sem que se fale do significado de qualquer música, ele pode pressupor apenas a descrição das modulações.
7.5. As modulações possuem traços essenciais e casuais.
7.51. São casuais os traços que derivam da maneira particular de composição modular.
7.52. Essenciais, os que, por si só, habilitam a modulação a exprimir seu sentimento e sentido.
7.521. O essencial na modulação é, portanto, o que têm em comum todas as modulações que podem exprimir o mesmo sentimento.
7.522. Do mesmo modo o essencial no tema é o que têm em comum todos os temas que exprimem a mesma variável modular.
7.6. Poder-se-ia, pois, dizer: o som propriamente dito é o que todas as modulações que compõem o som têm em comum.
7.7. Um modo particular de fixação espaçotemporal do audível, um estilo, pode não ter importância, mas é sempre importante que seja um modo possível.
7.71. E isso se dá na composição em geral: o singular mostra-se repetidamente como algo sem importância, mas a possibilidade de cada singular nos ensina uma lição sobre a essência do som.
7.711. Uma música, por exemplo, pode conter uma canção em si sem necessariamente se reduzir à formacanção.
8. A teoria esquizopathológica de cada ouvintecompositor é sua fixação de temas estilísticos entre uma modulação sonora e um sentimento.
8.1. O homem tem a capacidade de construir linguagens musicais com as quais se pode exprimir todo sentimento, sem fazer idéia de como e do que cada modulação significa – como também assobiamos sem saber como se produzem os sons particulares deste canto.
8.2. Uma fonte principal de nossa incompreensão musical é que não temos uma audição completa, mas sim fragmentada do uso dos sons em nossas músicas.
8.21. A audição panorâmica consiste justamente em ouvir as conexões. Daí a importância da contínua busca e criação de novas articulações modulares intermediárias entre as já existentes(arbitrariamente os movimentos de pulso, harmonia, melodia, cor timbrística e espacialização).
8.22. Criando assim sempre novos conceitos teóricos musicais.
8.3. As relações entre as linguagens musicais, os estilos, se assemelham com as que mantêm os jogos. Pois se você os contempla, não verá na verdade algo que fosse comum a todos, mas verá semelhanças de família nas modulações sonoras.
8.31. Algumas músicas se assemelham pelos ritmos constantes, mas diferenciam-se nos usos harmônicos. Da mesma forma há famílias de jogos harmônicos bem definidos, como o tonalismo, que se dividem pelos usos melódicos e timbrísticos em, por exemplo, o pop e a música de câmara.
8.32. A totalidade das músicas de um estilo é sua linguagem musical.
8.321. Todas as músicas se interconectam rizomaticamente em, no mínimo, algum aspecto modular.
8.4. A linguagem musical humana é um traje que disfarça o ruído constante do audível. E, na verdade, de um modo tal que não se pode inferir, da forma exterior do traje, a forma do audível trajado; isso porque a forma exterior do traje foi produzida segundo fins inteiramente diferentes do de tornar reconhecível a forma do corpo sem órgãos ao ouvintecompositor.
9. A linguagem musical é o estilo fixado.
9.1. A linguagem privada é a esquizopathológica.
9.2. O estilo é o foco que produz o audível dentre ao ruído.
9.3. Toda música é “crítica da linguagem musical”.
9.31. Os acordos tácitos que permitem o padrão da linguagem musical corrente são enormemente complicados.
9.4. O disco gramofônico, a idéia musical, a escrita musical, a física das ondas sonoras, todos mantêm entre si a mesma relação interna afiguradora que existe entre a linguagem musical e o audível.
9.41. A construção lógica é comum a todos.
9.42. A lógica é a linguagem dos jogos.
9.5. Que haja uma regra geral dum jogo por meio da qual o ouvintecompositor pode extrair a sinfonia da partitura, uma por meio da qual se pode derivar a sinfonia dos sulcos do disco e, segundo a primeira regra, derivar novamente a partitura, é precisamente nisso que consiste a semelhança interna dessas configurações, que parecem tão completamente diferentes. E essa regra é a lei da projeção, lei que projeta a sinfonia na linguagem das notas pela fixação temática. É a regra da transcriação dos sons na linguagem do disco gramofônico e das partituras.
9.6. Para entender a essência da composição musical, pensemos numa poética de equações, que afigura os sentimentos que descreve por meio de imagens subjetivas às danças dos algarismos, nunca inteiramente compreensíveis senão ao seu compositor.
9.61. A música reflete apenas o sentimental: pois não sei qual é a situação por ela produzida, por mais que compreenda a sua lógica de composição.
9.62. O ouvinte consegue no limite a intuição de seu autor.
9.621. A música produz o metafísico.
9.63. A música é seu sentido silenciado.
9.631. Mais se entende uma música quanto mais se entende suas partes constituintes, suas modulações sonoras.
9.632. Aos sons não se pode compreender, pois não há som em si.
10. A teoria pathológica de um estilo não procede de um modo tal que se explique cada música dele, mas sim as modulações elementar constituintes deste estilo de música.
10.1. A educação ostensiva das modulações parte dos temas estilísticos de cada ouvintecompositor que nos ensinaprende. Com as músicas, porém, nós nos entendemos.
10.2. Está na essência da música poder comunicar-nos um novo sentimento.
10.21. Uma música deve comunicar um novo sentido com modulações de velhos sentimentos da linguagem musical que nos precede.
10.211. Uma modulação de velhas modulações é uma nova modulação.
10.3. Uma música não é a representação dos sentimentos. Uma música é uma produtora dos sentimentos em questão pelas próprias experiências e memórias sinestésicas no ouvinte.
10.31. A realidade é comparada às paixões e razões pela composição musical, mas a música não é comparável com a realidade, daí seu passeio esquizo.
10.4. Uma música não pode ser verdadeira ou falsa. Uma música não argumenta.
10.41. A música produz apenas a existência e inexistência dos movimentos modulares dos sons e consequentemente dos sentimentos.
11. Tudo o que pode ser ouvido pode ser composto.
11.1. A música pode produzir qualquer sentimento, mas não pode produzir o que tem em comum com o sentimento – sua esquizopathológica.
11.11. Para podermos representá-la, deveríamos poder nos instalar, com a música, fora das paixões e razões, de nós mesmos e em última instância do próprio audível.
11.2. A música não representa.
11.21. A música não produz a lógica passional, esta linguagem estilística se espelha na música que compõe.
11.22. O que se espelha na linguagem musical não é musicável.
12. Uma linguagem musical é esta representação de um estilo de composição.
12.1. A música produz a esquizopathológica de seu compositor através das estruturas musicais, divisões arbitrárias em partes constituintes de seu estilo.
12.11. Podemos, em certo sentido, falar de propriedades formais dos sons e modulações, ou seja, de propriedades da estrutura musical e, no mesmo sentido, de relações entre essas estruturas.
12.12. A presença de tais propriedades e relações não pode, todavia, generalizar as estruturas, únicas; mostra-se, sim, como particulares daquela música que produz aquelas modulações de sentires e tratam daqueles sons.
12.121. A uma propriedade de uma música, podemos também chamar um traço de seu estilo.
12.122. É uma propriedade estrutural de uma música os traços sem os quais os sons e suas modulações, e consequentemente seus temas seriam impensáveis(arbitrariamente pulso, harmonia, melodia, intensidade, cor timbrística e movimentação espacial).
12.2. Não se pode distinguir uma estrutura musical de outra dizendo que uma tem esta e outra tem, contudo, aquela propriedade; pois isso pressupõe que faça sentido enunciar ambas as propriedades de ambas as composições.
12.21. A presença de uma relação estrutural entre duas músicas exprime-se por uma relação estrutural de suas modulações.
12.3. As estruturas musicais são inumeráveis.
12.4. Por isso a lógica sonora está submetida à paixão musical.
12.41. Dada a natureza sonora, a música mais simples pode também ser a mais complexa para um ouvintecompositor.
12.5. Por isso só a música nos fornece problemas definitivos.
12.6. Toda música é possível. Todos os sentimentos que ela gera são também possíveis.
12.61. A tautologia musical, ou a repetição perfeita de um som prévio, como mostraram-no os minimalistas, é impossível dado ao incessante acréscimo de memória na duração.
12.611. Se ouvimos duas músicas, a segunda terá a memória da anterior.
12.612. Não há portanto metamúsica.
12.6121. Mas é possível usarmos de músicas como modulações para uma nova composição.
12.62. A contradição musical, ou a negação perfeita de um som prévio por outro, como mostraram-no os aleatoristas, é impossível dado que em última instância todos os sons têm uma ligação de natureza.
12.7. Na sua essência, uma música não é provável nem improvável. Uma modulação ocorre ou não ocorre, não há meio termo.
13. Todo improviso acontece a priori.
13.1. De um tema nenhum outro tema pode ser logicamente concluído.
13.2. De um ruído ou música, não podemos deduzir a sua completa negação.
13.21. Daí a arbitrariedade passional da idéia de silêncio.
13.3. Todos os sons na lógica devem admitir justificação.
13.31. Devem evidenciar-se que não há sons lógicos, mas pathológicos.
13.32. Não há sons proeminentes.
13.321. Os pássaros não sabem como cantarão, cantam.
13.4. Toda dita lógica musical foca sons que distingue especiais dentre a outros arbitrariamente.
13.41. Este foco auditivocompositor é a paixão esquizóide de seu ouvintecompositor.
13.5. As soluções dos problemas sonoros derivam em temas pois estabelecem a tematização.
13.51. As soluções dos problemas sonoros são outros problemas sonoros.
13.52. Os problemas sonoros são os mais concretos que existem por se encontrarem em direta ligação com as paixões do ouvintecompositor.
13.6. Uma música é um jogo sonoro de regras em movimento.
14. A especificação de qualquer forma especial seria completamente arbitrária.
14.1. Os limites de minha audição são os limites da minha composição.
14.2. Os limites de minha composição são os limites da minha audição.
14.21. O audível e a minha música são um só.
14.3. O mundo tal como o encontro entre o som e o sentido demonstra a inexistência do sujeito ouvintecompositor.
14.4. O ouvintecompositor não pertence ao audível, mas é o limite do audível.
14.41. O ouvintecompositor é o limite de sua música.
14.411. A autoria se revela então como o limite de uma certa noção estilística da composição.
14.412. Uma certa dieta dos nossos plágios.
14.4121. Compor,o por com, é o plágio, este ato de desterritorializarmos e reterritorializarmos modulações.
14.4122. De original só os big bangs!, este paraísoperdido som-em-si inicial(se é que big bangs!).
14.4123. Sentir é plagiar.
14.41231. Plagiamos o saber por seu sabor.
14.5. Onde no mundo se haveria de notar um ouvintecompositor metafísico?
14.51. Você se diz que tudo se passa no ouvido e no campo auditivo. Mas o ouvido não se escuta.
14.52. E nada no campo auditivo permite concluir que é ouvido a partir de um ouvido.
14.53. Ouvimos com nosso todo.
14.6. Isso está ligado a não ser nenhuma parte de nossa experiência também a priori.
14.61. Tudo que ouvimos poderia também ser diferente.
14.62. Não há uma ordem a priori dos sons.
15. Na composição, processo e resultado são equivalentes.
15.1. A competência e a performance são indissociáveis.
15.2. Em última instância, só há processo e performance. O resultado da obra advém com a morte do compositor. E só assim se descobre sua competência.
15.3. A teoria musical é a esquizopathológica de um compositor usando sua música como argumento estético.
15.31. A música é transcendental.
15.32. A música transcende a seu ouvintecompositor nas suas paixõesrazões.
15.4. As composições são averiguações de suas modulações.
15.5. À questão de saber se a solução dos problemas musicais requerem a intuição, deve-se responder que é precisamente a linguagem musical que fornece, nesse caso, essa intuição.
15.51. As mecânicas tonais, por exemplo, põem a descrição do audível numa forma unitária, o piano. Concebamos uma superfície de teclas brancas sobre a qual houvesse manchas pretas irregulares. Dizemos, então: qualquer que seja a configuração que disso possa resultar, sempre poderei aproximar-me o quanto quiser de sua descrição recobrindo a superfície com uma rede quadriculada de malhas convenientemente finas(tons e semitons) e dizendo, a respeito de cada quadrado se é branco ou preto(natural ou sustenidobemol).
15.52. Terei posto assim a descrição da superfície sonora numa forma unitária. Essa forma é arbitrária, pois eu poderia ter utilizado, com mesmo sucesso, rizomas triangulares ou hexagonais(modos pentatônicos, microtonais frequenciais) ou ainda não ter cristalizado e simplesmente intuído a mancha sonora a partir de todas as malhas que consigo conceber.
15.6. Às diferentes redes correspondem os diversos sistemas musicais.
15.61. E todas as redes serão lógicas, o que reafirma que a música é sempre pathológica e os sistemas, sempre arbitrários senão segundo seu esquizo ouvintecompositor.
15.611. Não existem dois pianos com a mesma afinação.
15.62. Caracteriza um sistema musical então, uma descrição completa do espectro sonoro, o audível por meio de uma determinada rede de malhas de determinada finura.
15.63. A mecânica dos sistemas musicais são uma tentativa de construir, segundo um só plano, todas as músicas verdadeiras para um compositor.
15.7. O que o ouvintecompositor silencia é seu falso.
15.8. Mas nenhum compositor se basta em falar de seus limites auditivos e composicionais, mas dos limites gerais da audição e da composição.
15.81. A experiência sonora é solipsista e nisto, sempre única.
15.82. Estes escritos são parte da minha teoria musical baseada nas minhas experiências e memórias sinestésicas enquanto ouvintecompositor.
16. Não podemos comparar nenhum processo com o decurso do tempespaço – que só é experienciável nas modulações sonoras – mas apenas com um outro processo durável.
16.1. Dois sons podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo, na mesma velocidade ou não, pois que se entressoam numa mesma modulação.
16.111. Diria-se que são como um mesmo som.
16.112. Duas músicas diferentes podem ser estabelecidas deste mesmo som pelas modulações diversas de vários ouvintescompositores.
16.12.
16.2. É por isso que a descrição do curso temporal de uma música só é possível se no ampararmos num outro processo(ampulheta, metrônomo, partitura ou em outras músicas.)
16.21. De onde se gera o relativismo total dos tempos modulares(andante, allegro, etc.) e das alturas(o Lá central do piano a 220mHz).
16.3. Toda a moderna audição das músicas está fundada na ilusão de que as chamadas leis tonais, modais, seriais, minimais e também as físicas sejam explicações dos fenômenos auditivos.
16.31. Assim detêm-se diante das leis musicais como diante de algo intocável, como os antigos diante de seus modos cíclicos repleto de deuses.
16.32. E uns e outros estão certos e errados. Os antigos, porém, são mais claros, na medida em que reconhecem um termo final claro, enquanto, no caso dos novos “científicos” sistemas, é preciso aparentar que está tudo explicado.
16.4. O audível é independente de minha vontade.
16.5. O processo de teoria musical consiste em adotarmos a lei mais simples que se possa pôr em consonância com nossas experiências.
16.51. Esse processo não tem, contudo, nenhum fundamento lógico, mas apenas esquizopathológico.
16.52. É claro que não há nenhuma razão para acreditar que realmente ocorrerá o mais simples.
16.6. A música está em toda parte, mas não tem um domínio que lhe seja próprio.
17. Não há um sistema musical fechado.
17.1. Não há uma necessidade lógica de nenhum sistema musical.
17.2. Há talvez necessidades contextuais pragmáticas(culturais, históricas, políticas, recreativas, etc.).
17.21. A posição que a teoria musical ocupa atualmente, no coração da composição, conduz à adoção de uma definição da música unicamente como meio de transmissão de mensagens; e o resto, o esquizopathológico como sendo só o ruído e a redundância da utopia tácita.
17.3. A questão de sua interpenetração com o campo social(socius) nunca é colocada, os problemas relativos ao contexto da comunicação permanecem marginais.
17.31. Estas necessidades contextuais são também modulações das composições na medida que a ontologia da música se baseia nas paixões de seu ouvintecompositor.
17.32. Não há linguagem musical em si, uma unidade teórica como a do tonalismo é inseparável da construção de uma formação de poder, neste caso o tom.
17.321. Como também não pode existir música nacional, mas fenômenos de retomada de poder musical por um grupo de ouvintescompositores numa certa nação.
17.322. Não há revolução musical sem uma revolução sentimental.
17.4. O audível advém, de um núcleo elementar da primeira das significações sonoras, ou como um dos traços fundamentais da pragmática de educação ostensiva de um certo tipo de sociedade, como a expressão de um mecanismo abstrato que garante a consistência de um certo tipo de ordem musical.
17.41. Por exemplo, a questão não é se o ouvintecompositor é dono de sua música ou não, mas exatamente a desterritorialização da composição da pragmática deste contexto plagiadores/donos pela reterritorialização dela numa esquizopathológica própria do ouvintecompositor.
17.42. O poder se apossa do gozo de musicar como se apossa de todo gozo, para manipulá-lo e fazer dele um produto gregário.
17.5. Cada música cristaliza uma dança muda de modulações rizomáticas fluindo ao mesmo tempo no corpo social e no corpo individuado.
18. Todas os sons têm igual valor, mas as músicas têm valores distintos.
18.1. O sentido do audível deve estar fora dele, no que o foco silencia do ruído.
18.11. No audível, tudo é como é e tudo acontece como acontece; não há nele nenhum valor – e se houvesse, não teria nenhum valor.
18.111. Se há um valor que tenha valor, deve estar fora de todo acontecer e ser-assim.
18.112. Pois todo acontecer e ser-assim é casual.
18.12. O que o faz não casual não pode estar no audível; do contrário, seria algo, por sua vez, casual.
18.13. É por isso que tampouco pode haver composições meramente lógicas.
18.2. É claro que a pathológica musical não se deixa exprimir por completo senão no esquizo das suas composições.
18.21. A pathológica é transcendental.
18.3. O primeiro pensamento que nos vem quando se formula uma lei musical da forma “você deve...” é: e daí, se eu não fizer? É claro, porém, que a teoria nada tem a ver com punição e recompensa, no sentido usual.
18.31. Portanto, essa questão de quais sejam as consequências de uma composição não deve ter importância no momento da composição se o ouvintecompositor quiser ser fiel às paixões que o levam a compor.
18.32. Deve haver, na verdade, uma espécie de recompensa e punição passional(ou se preferir, sentimental), mas elas devem estar e estão na própria música.
18.321. E também, é claro, a recompensa deve ser algo de agradável e a punição algo de desagradável.
18.4. Da vontade enquanto portadora das paixões e sentimentos não se pode falar.
18.41. Esta vontade é só a música que compõe.
18.5. Se uma boa ou má volição altera o audível, só pode alterar os limites do audível, não as músicas; não o que pode ser musicado, as paixões.
18.51. Em suma, o audível deve então, com isso, tornar-se a rigor outro audível.
18.52. Deve, por assim dizer, minguar ou crescer como um todo.
18.521. A audição do feliz é diversa da do infeliz.
18.53. Como também a audição, com a surdez, não morre, se altera.
18.531. A surdez é um evento auditivo, como Beethoven ensinou-me com lágrimas.
18.6. A solução do enigma sonoromusical está fora do sommúsica.
18.61. Como seja o audível, é completamente indiferente para o quê. O silêncio não se revela no audível.
18.611. As músicas fazem todas parte apenas do problema, não da solução.
18.612. Todo canto é um canto do canto.
18.6121. Só o silêncio soluciona.
18.62. Do sentimento do audível como totalidade limitada(péras) é produzido o sentimento do silêncio na abstração do além destes limites(ápeiron).
18.7. Para uma resposta que não se pode dar, não se pode tampouco questionar.
18.71. O silêncio não existe, ou ainda, eu também não tenho nada a dizer e estou dizendo-o.
18.72. Se uma dissonância se pode compor, sua consonância também é possível.
18.721. Pois só podem haver dissonância onde se conhece as consonâncias.
18.8. O método correto da teoria musical seria propriamente este: nada dizer, senão o que se pode dizer; portanto, escadas esquizopathológicas pelas quais chegamos ao presente audível– portanto, algo que nada tem a ver com teoria musical; e então, sempre que alguém pretendesse dizer algo das leis sonoras e ou musicais, mostrar-lhe que não conferiu os significados passionais a certas modulações sonoras e ou temas em suas teorias. Esse método seria, para ele, insatisfatório – não teria a sensação de que lhe estivéssemos ensinando música; mas esse seria o único rigorosamente correto.
18.9. Minhas teorias elucidam dessa maneira: quem me entende acaba por reconhecê-las como retrato de meus devaneios esquizopathológicos, após ter escalado por eles.
18.91. Devo, por assim dizer, jogar fora a escada após ter subido por ela.
18.10. Escrever sobre a música é um apaixonante paradoxo. Ao mesmo tempo que nunca alcançamos o inefável das modulações de nossos sentimentos, o próprio escrever sobre o papel a dançar é música a gestar um novo audível.
18.101. As palavras com as quais expresso minha música são também, em parte, minha reação à minha música.
18.102. Minha música é também reação às minhas palavras
19. Sobre aquilo de que não se pode falar, dever-se-ia cantar.
“...la la ri la la...”
Lewis Caroll
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